O espelho retrovisor


Ainda se lembra daquele dia em que conduziu um automóvel pela primeira vez? Aquelas aulas de condução com o desafio do ponto de embriagem e a clássica postura “banco tão chegado à frente que o queixo e joelhos batem no volante”.

Entre o nervosismo de estar no meio do trânsito em hora de ponta sem infrigir nenhuma regra do Código da Estrada e o stress de não deixar o carro ir a baixo, ainda havia o instrutor, mais ou menos simpático, que nos relembrava o que fazer em cada manobra.

Como bons alunos, e porque não queriamos chumbar no exame, levavamos tudo muito a sério e pensávamos cinquenta vezes antes de fazer qualquer manobra mais perigosa ou complicada.

Uma das coisas que demorei mais tempo a aprender foi a ultrapassar. Tive a felicidade de ter um instrutor muito profissional, simpático e paciente que me ajudou com as suas preciosas indicações. “Vá lá, primeiro olhe para os espelhos e veja se pode fazer a manobra…” Depois de diversas tenativas frustradas, houve um dia em que as coisas correram bem e ultrapassei um veículo pela primeira vez… afinal, até era fácil!

Já passaram mais de 8 anos desde essa altura. Com o passar do tempo, fui ganhando auto-confiança e hoje conduzo de forma tão natural que nem preciso pensar… os gestos e as manobras já estão automatizadas.

Não lhe acontece, por vezes, já nem olhar com aquela atenção pelo espelho retrovisor ou pelos espelhos laterais e ultrapassar confiante de que está tudo bem? Os riscos são ouvir umas buzinadelas, apanhar um grande susto e mesmo ter um acidente.

É interessante que quando começamos a nossa caminhada com Deus também somos muito cuidadosos. Estamos sempre atentos, não perdemos as aulas de código (estudo bíblico), nem faltamos às de condução (comunhão diária com Deus). O nosso único objectivo é não desiludir o nosso Instrutor de Vida…

Depois, passamos os primeiros testes, as primeiras lutas e vitórias nos embates do dia-a-dia e vamos confiando mais e mais em Deus.

O perigo está no facto de que a nossa confiança em Deus pode passar, sem darmos por isso, para auto-confiança… Ou seja, começamos a confiar mais em nós e na nossa capacidade para ultrapassar os problemas, do que no nosso Redentor. Passamos apenas a pedir (orar) e deixamos de pensar (vigiar)… Deixamos a mão do nosso Pai e assumimos uma lenta e subtil emancipação espiritual, sem pensar nos riscos que corremos.

O apóstolo Paulo falou à igreja de Éfeso acerca da importância de crescermos, de nos tornarmos espiritualmente adultos e maduros… mas o mesmo escritor lembra-nos que devemos de seguir, de correr para o alvo… o mesmo alvo que tivémos no dia em que nos rendemos à evidência da necessidade de ter Jesus a reinar na nossa vida.

Que a nossa confiança esteja assente nas experiências com Deus que coleccionamos ao longo da vida, e não nas nossas capacidades, resistência ou inteligência para ultrapassar as barreiras. Afinal, sabemos o Código Eterno e temos o Instrutor que está ao nosso lado a toda a hora para nos aconselhar…

Esteja atento, não confie apenas na sua experiência e lembre-se do espelho retrovisor.

Artigo Publicado na Revista Novas de Alegria Junho 2006, mas escrito em 2004.

Comentários