A culpa não morre solteira.

Quem não conhece o ditado “A culpa morreu solteira”? Este dito popular fala-nos do não assumir responsabilidade, de um clima estranho de impunidade apesar do dado, em que de boca calada acabamos por “sacudir a água do capote” (outra pérola da sabedoria do povo). Mas parece que há um lapso no título do artigo. Não é um erro — assumo (mea culpa!) — é propositado. A verdade é que a culpa nunca pode morrer solteira. O viúvo (ou viúvos) anda(m) por aí... escondido(s) nas suas próprias (des)culpas. 

Por vezes, não há um momento ou ato específico que levou ao desastre. E, por isso, não encontramos um réu para julgarmos. Há situações em que a culpa se pode dividir por várias pessoas, épocas e acontecimentos... e, por isso, é de todos, mas não é de ninguém — das coisas mais simples às mais complexas ou escandalosas. Basta olharmos para a música (mais ou menos) popular portuguesa para encontrarmos poemas bem ilustrativos desta realidade!


A letra do célebre tema interpretado por Tony Carreira, que dá título a esta edição, lamenta-se: “Ai destino, ai destino / Ai destino que é o meu / Ai destino, ai destino / Destino que Deus me deu.” Ora cá está... e no contexto, a traição conjugal de que o homem que conta a história foi vítima é culpa... de Deus, porque, afinal, estava “destinado” por Ele. Já a senhora do fado, Amália Rodrigues, confessava a sua crença: “Foi por vontade de Deus / Que eu vivo nesta ansiedade / Que todos os ais são meus / Que é toda minha a saudade / Foi por vontade de Deus.” Outra canção, esta do famoso cantautor português António Variações, descobre, no refrão de um dos seus temas: “A culpa é da vontade / Que vive dentro de mim / E só morre com a idade / Com a idade do meu fim.” Era como se dissesse “é mais forte do que eu” ou “é o meu feitio” ... E lá se larga a culpa para cima de “algo” para não assumirmos a responsabilidade total dos nossos atos.

Está nesta nossa natureza humana distorcida pelo pecado esta tendência. Tantas vezes desculpamo-nos com tudo e mais alguma coisa. Normalmente a culpa é dos outros, das circunstâncias, do nosso temperamento... enfim. Não que a culpa seja sempre ou apenas nossa, mas quando o é, assumirmos (sem desculpas) é que se torna mais complicado. Outras vezes culpamos alguém que nada tem a ver com o assunto, mas que tem as “costas largas”: Deus! Nada de novo. Foi assim com a primeira desobediência do Homem... Quando Deus questionou Adão acerca do facto de ter comido do fruto (único!) que não podia, este deitou as culpas para Deus e para Eva. Quando Deus questionou Eva, ela logo apontou o dedo à serpente. E a serpente... ficou de rastos (literalmente!).

Em contraste com todas as rimas e canções, com toda a nossa “prosa”, Deus assume a nossa culpa, toma o nosso lugar, por todos os nossos pecados, para que o nosso escape fosse possível. Aquele que é o mais injustiçado no meio disto tudo, faz justiça através da Sua própria entrega. A culpa da Humanidade não morre solteira — Jesus assumiu tudo, completamente, na nossa vez. Sem isso, não havia hipótese para nós. Hipóteses de quê? — podem questionar. De termos acesso à verdadeira fonte de alegria, felicidade e satisfação: Deus.

“Porque todos pecaram, tendo perdido o direito de acesso à glória de Deus. E pela sua bondade, que não merecemos, nos declara inocentes da culpa, pela obra de Jesus Cristo, o qual nos liberta dos nossos pecados, sem nada pagarmos para beneficiar disso. Na verdade, Deus enviou Jesus Cristo para suportar o castigo que mereciam os nossos pecados e assim anular a justa cólera de Deus contra nós. Somos tornados justos perante Deus quando cremos que Jesus derramou o seu sangue, sacrificando a sua vida por nós. Deus foi assim inteiramente justo quando não castigou aqueles que pecaram em tempos antigos, porque aguardava o tempo em que Cristo havia de vir revelar inteiramente a sua justiça. E agora ele pode receber os pecadores porque Jesus tirou os seus pecados.” (Romanos 3:23-25, OL)

Ana Ramalho Rosa

in revista Novas de Alegria, abril 2018. Texto escrito conforme o novo acordo ortográfico

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