O absurdo do vazio

Quando cessa a vida, existe um vazio e um vago no pensar humano. Gostemos ou não da ideia, todos nós nos cruzamos com a possibilidade da cessação da nossa existência. Sejamos nós cristãos ou não, encontramos no último fôlego um evento indistinguível. O tempo de respirar, crescer, pular, correr, comer e criar uma marca no mundo, cessa. E o que sobra em seguida?

Não devemos viver com um absoluto terror da morte, nem viver como se a vida fosse de titânio. A vida é um bem precioso, um fluxo de vitalidade que alimenta e dá cor ao planeta. A vida tem uma origem e vários pontos decisórios. O corpo em que nascemos e crescemos, tarde ou cedo voltará ao pó[1]. Cientificamente, somos matéria em movimento, composta por cargas eléctricas e cuja duração de vida é variável. Varia de acordo com vários factores e variáveis; certas vidas cessam mais cedo, outras mais tarde.

O facto comum a todos é este, a morte é certa, a vida não. Fisicamente falando. Que o diga Christopher Hitchens[2] (jornalista e escritor britânico) assumido ateu e membro do quarteto ateu composto com Richard Dawkins, Daniel Dennet e Sam Harris. O fleumático britânico, a quem era reconhecida a fúria intelectual e o pouco perfil tolerante perante opiniões com as quais não concordava (nomeadamente aquelas que considerava “balelas” – como fez em várias entrevistas sobre a liberdade de expressão em relação ao Islão, etc.), cessou a sua existência física e humana na passada semana. Hitchens sofria de um tumor em estado terminal, mas conservou sempre a sua objectividade humanista e iluminista. Pessoalmente, não concordando com o seu posicionamento, sobretudo em relação à Igreja e Deus, não deixo de sentir um estranho “pesar” por mais uma vida que cessa.

E tudo isto deveria ser motivo para um sentimento diferente, pois creio que Deus nos fará ressuscitar, para a glória eterna com Ele[3]. Pelo menos, aos que O aceitam e submetem a sua vida à vontade divina e amorosa do Pai[4]. A minha preocupação não surge só em relação a este homem relativamente conhecido, mas também surge devido à quantidade enorme de vidas que cessam e as quais não conhecem ou não aceitaram Jesus como Senhor e Salvador. Essas vidas caminham de modo indistinto pela face do planeta, vivendo como suas próprias regentes e fabricantes de moralidade e direcção.

Não é o facto da auto-suficiência que tanto me pesa no coração, mas sim o facto de se persistir numa auto-suficiente destruição, sem que sequer se deseje ser socorrido, porque existe a ideia de que tudo o que não é visível, é por si só improvável. Não me assusta, mas pesa-me no interior do coração ver que não se está a ser feito tudo o que é possível para se mudar essa situação. Mas também, que nem todos serão recebidos, porque aquando do convite, estão demasiado ocupados ou endurecidos; demasiado centrados em si ou focados noutras atenções; demasiado duros, áridos ou insensíveis.

Não que Deus não possa revelar-se como fez a Abraão[5] e Moisés[6], no meio de terras votadas à idolatria, à separação da união com Deus e à negação prática da Sua presença e do Seu amor. Mas porque o nosso coração é parte preponderante da aceitação do bater à porta. E o bater à porta é um convite, uma possibilidade tremenda de viver uma vida em que a certeza final reside nisto. Aquele que começou a boa obra em cada um de nós, seres imperfeitos, impregnados de pecado e de falhas; é fiel para a terminar, concluindo-a para a Sua glória e para nosso benefício; no momento da volta do Senhor[7].

A vida por si só é preciosa, mas é mais do que aquilo que vemos, sentimos, cheiramos, ouvimos e provamos. Existem planos de paralelos intermináveis e que transcendem os sentimentos humanos ou a nossa capacidade de levar um raciocínio lógico. Deus em si mesmo, pode parecer-nos lógico e ilógico, mas na pura e perfeita verdade da Sua existência e essência, Ele é perfeito[8], com uma vontade boa e agradável[9].

Tudo menos que a Sua presença e amor, levam a que na cessação do último fôlego, na paragem do último batimento cardíaco, no fecho dos olhos para a realidade cognitiva humanista e meramente física; tudo seja votado a um destino em que a separação em vida se estende à separação após a mesma[10]. Essa separação não é agradável, é condenatória, é destrutiva, é dilacerante e agonizante[11] e a ela acedem todos aqueles que negam[12] o senhorio de Jesus Cristo.

A este vazio pós-existência, segue-se tudo o que de negativo lhe está associado. Vejo esta opção como um absurdo, como uma vontade de sofrimento eterna após uma vida inconclusiva. O nosso padrão de regulamentação do certo e errado não pode ser o humano, pois nós mesmos estamos demasiadamente conspurcados e viciados em nós para nos podermos guiar e julgar. A regra de ouro é a pessoa de Deus, perfeito e imutável[13].

Viver a vida no vazio, é olhar demasiado para dentro do abismo e deixar que o abismo nos consuma. Viver uma vida assente na lógica do centro no Homem e cessar mais tarde sem possibilidade de provar a verdadeira glória é ilógico, absurdo, não tem o mínimo de sentido. Nem todo o humanismo em seu esplendor pode contradizer algo que é irrefutável. O Homem não vence a morte por si e nela vê a sua amante amarga, mas Cristo já venceu a morte[14] e com Ele somos mais que vencedores.

No vazio existe pranto e ranger de dentes, mas na presença d’Ele existe um banquete. O convite está feito[15], cabe a cada um de nós aceitá-lo de forma sincera e diária, para podermos viver a vida fora do vazio e em toda a sua abundância.

Ricardo Rosa


[1] - Génesis 3:19
[3] - 1ª Coríntios 6:14
[4] - 2ª Coríntios 4:13-15
[5] - Génesis 12:1
[6] - Êxodo 3:1-4
[7] - Filipenses 1:6
[8] - Mateus 5:48
[9] - Romanos 12:2
[10] - Lucas 16:26
[11] - Mateus 25:41; Apocalipse 21:8
[12] - Mateus 10:33; Lucas 12:9
[13] - Tiago 1:17
[14] - 1ª Coríntios 15:53-57
[15] - Apocalipse 3:20

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