“Tal pai, tal filho?”

O processo da paternidade é algo entusiasmante. A pouco tempo de ser pai pela primeira vez, medito sobre o modo como posso ajudar o meu filho a crescer sabiamente num mundo cada vez mais louco.
A minha caminhada pessoal com Deus não é genética, logo o meu filho terá que fazer a dele. As nossas opções são pessoais, à mão estendida de Deus por meio de Jesus, cada um deve responder aceitando ou não esse resgate. A Bíblia mostra-nos que por muito íntimos de Deus que um homem seja, os seus filhos podem não lhe seguir o exemplo. Podemos estudar brevemente quatro casos que nos ajudam a ter uma visão mais abrangente do assunto.

TAL PAI, TAL FILHO
Um dos melhores exemplos desta máxima é a pessoa de Zacarias um sacerdote(1) zeloso do cumprimento da Lei, homem justo(2cuja mulher era estéril e que foi pai de João Baptista(3). Um filho que foi um milagre, mas também o percursor do caminho de Jesus(4), a voz que gritava no deserto anunciando que a redenção do Senhor estava próxima e incentivando ao arrependimento(5). A fidelidade do pai é revista no ministério do filho, não porque Zacarias tivesse cumprido o que cabia a João, mas porque ambos tinham o mesmo zelo para com as coisas de Deus. É caso para dizer “tal pai, tal filho”.

BOA ÁRVORE, MAUS FRUTOS?
Existe um ditado que diz que “A maçã nunca cai longe da macieira”. Com isto querem dizer que os filhos geralmente não se afastam muito dos padrões de vida dos pais. David foi o Rei mais emblemático de Israel, mas a falta de foco na sua família levou a que tivesse problemas sérios entre os seus filhos.
O primogénito de David(6) é o exemplo de que uma boa árvore (pai) pode dar maus frutos (filhos). Neste caso, Amnom deu largas à tendência natural do ser humano para pecar, sofrendo de um “amor” doentio. Forjou um esquema com um amigo que resultou no abuso da sua irmã Tamar, para depois a desprezar(7). A falta de ação de David não fica isenta de reparo. O Rei irou-se mas não corrigiu o problema gerado e permitiu que a situação se agravasse.
Poderemos argumentar que David não foi perfeito(8-9), o que pode ter ajudado Amnom a criar uma imagem de impunidade. Afinal, se o pai errou, ele também podia pecar e, sendo filho do Rei, poderia fazer o que quisesse, pois era o primeiro candidato à sucessão do pai. No entanto, apesar de ter pecado, David arrependeu-se verdadeiramente quando foi corrigido por Deus, sofrendo as consequências dos seus erros mas sendo ao mesmo tempo restaurado pela Sua mão saradora(10), coisa que o filho mais velho não fez.
Mas uma ferida aberta, infeta e dá problemas. A “falta de curativo” no que toca às ações de Amnom, fez com que Absalão, seu irmão, viesse a executar justiça pelas próprias mãos, entrando em rota de colisão com David(11). Absalão revoltou-se e tentou tomar Israel à força das mãos do pai. Novamente, vemos um exemplo contrastante em relação a David. Mesmo sendo ungido por Deus para reinar sobre Israel, David não tentou apoderar-se do trono de Saul, mesmo quando o poderia ter morto e ser aclamado por isso(12). Pelo contrário, aguardou paciente, dolorosa e perigosamente que a vontade de Deus se cumprisse plenamente em relação a esse assunto.
Uma boa árvore (David), dois péssimos frutos (Absalão e Amnom). O bom exemplo de David em relação à sua humilhação e submissão perante Deus fica manchado pela falta de capacidade em lidar com os problemas familiares. Um pai pode dar o melhor exemplo, mas no fim de contas, a decisão de o imitar ou não, cabe sempre ao filho.

O PAI IMPERTINENTE FAZ O FILHO DESOBEDIENTE
O primeiro rei de Israel após a divisão foi Jeroboão(13) e, o que parecia ser um início auspicioso contra a ameaça ditatorial de Reboão (que levou à divisão do reino de Israel), tornou-se rapidamente na primeira pedra de uma linha de desilusões e monarcas que levaram o povo para longe de Deus. Jeroboão inverteu a tendência do povo de cultuar em Jerusalém, invertendo também o padrão da santidade em direção à promiscuidade espiritual(14). O mau exemplo do pai alastrou-se ao filho como se de um vírus se tratasse. Abião sucedeu ao pai no trono e nos maus costumes(15), e lamentavelmente fez valer o ditado “quem sai aos seus não degenera”…

QUEM NÃO SAI AOS SEUS, DEGENERA?
Se Abião foi um mau rei, o seu filho Asa tentou desviar-se do caminho e dos costumes do pai. No bom sentido, degenerou em relação ao pai. Com zelo de agradar a Deus, afastou a sua mãe idólatra para que ela não reinasse, removeu os ídolos, fez o que era certo para com o Senhor e tornou a trazer para o templo a prata, o ouro e os vasos(16).
Apesar de no fim da sua vida ter cometido erros, Asa é o exemplo de que não são as condições familiares adversas em que estamos inseridos que devem ditar o nosso envolvimento e fidelidade a Deus. Ainda que honremos pai e mãe como lemos em Êxodo, a máxima a aplicar é a que Pedro nos ensina em Atos 5:29 “Devemos obedecer mais a Deus do que aos homens” (OL).

Como homem, esposo e pai, tenho a perfeita noção de que Deus exige de mim uma boa mordomia das bênçãos que coloca na minha vida. Ser pai é mais do que “dar o pão”, é sem possibilidade de exclusão também o “dar a educação”. Porque no fundo, a melhor herança que podemos dar e receber é o exemplo de uma vida em amor a Deus e ao próximo. E isso sim, pode ser passado de geração em geração, como motivo de alegria. “Para uma pessoa, os seus netos são como que a sua coroa de glória, tal como para um filho o é também seu pai.” (Provérbios 17:6, OL)

Ricardo Rosa

(1) Lucas 1:5; (2) Lucas 1:6; (3) Lucas 1:57-59; (4) Lucas 1:16-17; (5) Lucas 3:1-8; (6) 1 Crónicas 3:1; (7) 2 Samuel 13:1-19; (8) 2 Samuel 11:1-5; (9) 2 Samuel 11:14-17; (10) 2 Samuel 12:1-23; (11) 2 Samuel 13:23-29; (12) 2 Samuel 24:1-7; (13) 1 Reis 12:20; (14) 1 Reis 12:25-33; (15) 1 Reis 15:1-3; (16) 1 Reis 15:9-15


in revista Novas de Alegria, outubro 2013

Texto escrito conforme o novo acordo ortográfico

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